O cultivo do cacau é limitado a poucas regiões no mundo. O estado do Pará, de clima quente e úmido, é um exemplo, sendo responsável nas últimas décadas pelo aumento da produção brasileira, com alta produtividade. O país é o sétimo produtor mundial de cacau, e o quinto processador de seus derivados, tais como licor e manteiga, empregados na indústria de chocolate. Entretanto, os impactos ambientais de atividades agrícolas, tal como a cacauicultura, vêm sendo questionados, e possibilidades de mitigações avaliadas.
Nesse contexto, parceria entre a Universidade Estadual de Campinas, e o Instituto de Tecnologia de Alimentos, de Campinas, SP, teve por objetivo calcular a Pegada de Carbono do cultivo e do beneficiamento do cacau nas regiões Transamazônica e Xingu, no estado do Pará. Parte dos resultados foram apresentados no artigo “Carbon footprint of Brazilian cocoa produced in Pará state”, publicado no Brazilian Journal of Food Technology.
No estudo, fazendas que empregam os cultivos orgânico, convencional e orgânico-mercado justo (fairtrade) foram analisadas empregando-se a metodologia do protocolo Green House Gas (CHG Protocol, 2016). As emissões de gases de efeito estufa foram determinadas nas etapas de colheita, fermentação e secagem, com enfoque no impacto das mudanças climáticas.
Os resultados mostraram que a produtividade das culturas variou entre 600 e 1.250 kg/ha, próxima dos valores reportados na Colômbia (671 a 1000 kg/ha), e superior aos obtidos em Gana e Costa de Marfim (456 e 214 kg/ha). A Pegada de Carbono (carbon footprint) média determinada nas fazendas avaliadas foi de aproximadamente 10.500 kg CO2 eq/ t, considerando o cálculo da degradação da casca do cacau segundo o IPCC (2006). Segundo estudos, no processo produtivo do chocolate, a produção das matérias primas é a maior responsável pela emissão de gases de efeito estufa, entre 67 e 81% do total (Konstantas et al., 2018).
O estudo mostrou que as fazendas que empregam o processo convencional, utilizam herbicidas, inseticidas e fertilizantes, embora em quantidades baixas em comparação a outras culturas. No entanto, os fertilizantes a base de nitrogênio contribuem para a emissão de N2O, sendo considerados um dos principais impactos ambientais da cultura do cacau. Os resultados mostraram que quando empregada a compostagem das cascas do cacau, e posterior uso como fertilizantes, há redução de 75% da Pegada de Carbono devido a redução da emissão de metano. A prática, portanto, é uma alternativa ambientalmente interessante na cultura convencional.
A produção orgânica, por sua vez, que emprega apenas fertilizantes orgânicos, tem uma pegada de carbono consideravelmente menor, de aproximadamente 2.000 kg CO2 eq/ t, comprovando ser uma prática agrícola mais sustentável na produção de cacau. Entretanto, apesar dos resultados favoráveis, o estudo aponta que os produtores do Pará têm enfrentado dificuldades para o escoamento do cacau orgânico. O mercado absorve apenas 45% da produção, e o restante é comercializado como produto convencional, a preços menores. A certificação orgânica-mercado justo, por sua vez, devido ao maior interesse do mercado internacional, tem apresentado resultados melhores, com vendas de 71% da produção.
Segundo os pesquisadores, há ainda a possibilidade de venda de créditos de carbono por parte dos produtores, uma vez que o cultivo do cacau, cujo ciclo é de 40 anos, fixa o carbono no solo. A indústria de chocolate, por sua vez, poderia incrementar as vendas atribuindo alegações ambientais aos seus produtos, atingindo mercados mais exigentes, e revertendo maior renda aos produtores.
O estudo, portanto, mostrou que a metodologia de avaliação empregada, referência na determinação do impacto ambiental, permitiu um maior conhecimento sobre as práticas agrícolas da produção do cacau com relação ao lançamento de gases de efeito estufa na atmosfera. Os resultados beneficiam a cadeia produtiva do chocolate auxiliando na tomada de ações pela busca de maiores sustentabilidades ambientais, sociais e econômicas.
Revisado por SciELO em Perspectiva.