Uma investigação científica liderada pela Universidad Carlos III de Madrid (UC3M) e parcialmente financiado pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC) demonstrou que o tamanho e a composição das nossas redes de apoio social influenciam diretamente a forma como percebemos o nosso corpo. As conclusões desta investigação podem ajudar-nos em doenças como a dismorfofobia, a anorexia ou outros distúrbios alimentares.
Publicado recentemente na revista iScience, o estudo e no qual participaram mais de 100 pessoas utilizou a «ilusão dos passos» (Footsteps Illusion), uma experiência em que os sons dos passos de uma pessoa são modificados em tempo real para simular que provêm de um corpo mais leve ou mais pesado. Essas alterações auditivas mudam a percepção das pessoas sobre o seu próprio peso e provocam variações comportamentais, emocionais e fisiológicas, demonstrando como a imagem corporal é maleável em relação aos estímulos sensoriais.
Os participantes foram convidados a caminhar enquanto ouviam três tipos de sons de passos: um sem modificação, outro com passos que soavam como se fossem produzidos por um corpo mais leve e outro com passos que soavam como se fossem produzidos por um corpo mais pesado. Além disso, os participantes responderam a questionários sobre a sua imagem corporal, possíveis sintomas de distúrbios alimentares e a amplitude das suas redes de apoio social.
Os resultados dessa experiência mostraram que as pessoas que tinham redes sociais mais amplas e diversificadas, em geral, foram menos influenciadas pela ilusão sonora e tenderam a sentir-se mais satisfeitas com a sua imagem corporal e a apresentar menos sintomas de distúrbios alimentares. Pelo contrário, os efeitos modificados dos passos eram mais intensos em pessoas com redes sociais mais pequenas, concluindo-se que a perceção do corpo e a sua maleabilidade não dependem apenas de estímulos sensoriais imediatos, mas também são influenciadas pela estrutura social em que a pessoa está integrada.
«As implicações do nosso estudo são que o nosso círculo de amigos condiciona a forma como percebemos o nosso próprio corpo. Se tivermos um círculo de amigos mais alargado, percebemos o nosso corpo de uma forma mais positiva», comenta Anxo Sánchez, investigador do Departamento de Matemática da UC3M. «Poderíamos pensar que a autoperceção depende do próprio indivíduo, mas na realidade depende do número de pessoas que o apoiam e que o rodeiam», esclarece outro dos autores do estudo, Amar D'Adamo, investigador do Departamento de Informática da UC3M.
Estas descobertas evidenciam que contar com um apoio social amplo e diversificado reforça a estabilidade da autoperceção corporal e protege contra a influência de sinais externos que poderiam distorcê-la. Por outro lado, abrem a porta a novas intervenções sociais que ajudem a promover uma imagem corporal mais positiva e a mitigar os efeitos do estigma associado ao peso.
Além disso, a equipa defende a utilidade das aplicações móveis para ajudar as pessoas que podem sofrer de distúrbios associados a uma autoperceção negativa do seu próprio corpo: «No i_mBODY Lab, desenvolvemos tecnologias sensoriais que nos permitem alterar a perceção do corpo. Estamos também muito focados nas aplicações, pois queremos entender como podemos apoiar as pessoas”, por meio dessas tecnologias, explica Ana Tajadura, responsável pelo i_mBODY Lab, investigadora do Departamento de Informática da UC3M e beneficiário do ERC.
Este trabalho de investigação contou com o apoio do Conselho Europeu de Investigação (ERC grant agreement Nº 101002711; projeto BODYinTRANSIT), bem como com a ajuda da Fundação BBVA, através do seu programa Fundamentos, e do Ministério da Ciência, Inovação e Universidades, através dos projetos BASIC (PID2022-141802NB-I00) e SENSEBEAT-DS (PID2023-150259OB-C21). Além disso, o projeto contou com o financiamento da Universidad Carlos III de Madrid e da União Europeia (programa de investigação e inovação Horizon 2020 - Marie Sklodowska-Curie grant Agreement Nº 801538).
Vídeo: https://youtu.be/9qsUCxPGbaE